20 maio 2012

Dois poemas de Xanana Gusmão

POVO SEM VOZ

Nosso grito é o silêncio
Na passagem do tempo
E o tempo é o sangue
No silêncio do mundo!

— Ouvi, mundos!
Ouvi, gentes da política!
Invadistes a nossa Pátria com o Suharto,
Isolastes Timor-Leste na guerra fria
e torturastes-nos com a indiferença
e matastes-nos com a cumplicidade.

— Ouvi, ouvi as vossas culpas!
Desengajastes a nossa causa com Jacarta,
Minimizastes o nosso direito na ONU
e prendestes-nos com iénes
e massacrastes-nos com dólares.

Nosso tempo é o silêncio
Nas mudanças do mundo
e o sangue é o preço
nos mundos do silêncio!

— Ouvi, mundos!
Ouvi, gentes do poder!
Abençoastes a mortandade com catedrais,
Enterrastes a tragédia nos investimentos
e desafiastes a nossa consciência
e reprimistes os nossos anseios.

— Ouvi, ouvi as vossas culpas!
Atraiçoastes os vossos próprios princípios,
Manipulastes as vossas próprias normas
e encarcerastes-nos na realpolitik
e matastes-nos como os direitos humanos.

... Somos POVO SEM VOZ
alma sem fronteira com a dor
corpo na escravidão aberto ao tempo
Pátria — um cemitério de interesses!
A nossa luta...
é a história
do poder do silêncio!


MAR MEU

Pudesse eu
prender entre os dedos
os suspiros do mar
e distribui-los
às crianças

Pudesse eu
acariciar com os dedos
a suave brisa das ondas
e sentir cabelos
de crianças

Pudesse eu
sentir nos dedos
o beijo das espumas
e ouvir os risos
das crianças

Pudesse eu
tocar com os dedos
o sono do mar
e embalar os olhos
de crianças

Pudesse eu
ter entre os dedos
belas conchinhas
e fazer colares
p’ra as crianças

Oh, mar meu!
Porque esperas?
Porque não dás?
Porque não sentes?
Porque não ouves?

Imerso nos meus pensamentos
fui subitamente estremecido
Do mar, do meu mar,
vinham tremores
saídos de barcos

Olhei para o céu
que explodia
os suspiros do mar
eram choros de agonia
a suave brisa

o cheiro do pó e do sangue
o beijo das espumas
o estertor da morte
o sono do mar
as pedras da sepultura

e as belas conchinhas
desenhavam
o destino da Pátria!

Crianças de Timor-Leste (Foto de autor não identificado)

Comentários: 2

Anonymous Anónimo escreveu...

🇹🇱❤️😘🙏

15 maio, 2022 16:43  
Anonymous Anónimo escreveu...

Mensagen do texto poetico

17 março, 2023 06:17  

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