15 maio 2013

Efeito dominó

(Foto: ORF)

O efeito dominó, como toda a gente sabe, é o efeito que se obtém quando se fazem tombar sucessivas pedras de dominó colocadas verticalmente, umas a seguir à outras e próximas entre si, de tal modo que a queda de uma das pedras provoca a queda da pedra seguinte, a queda desta, por sua vez, provoca a queda da que se lhe segue, e assim sucessivamente até à última pedra, numa reação em cadeia.

No caso de as pedras de dominó usadas terem todas a mesma massa e as mesmas dimensões, ninguém duvida de que o efeito dominó se produz. E se as pedras forem de diferentes massas e tamanhos? Será que uma pedra do tamanho de uma pulga conseguirá derrubar outra que seja tão alta como a Torre dos Clérigos? A resposta é sim, desde que entre a primeira e a última haja uma sucessão de pedras progressivamente maiores e de maior massa.

Era geralmente aceite que uma pedra era capaz de derrubar uma outra cuja massa, altura, largura e espessura fossem 1,5 vezes maiores do que as suas. O holandês J. M. J. van Leeuwen, da Universidade de Leiden, demonstrou matematicamente que a proporção entre uma pedra e a seguinte poderia ser de 2 em vez de 1,5, desde que as pedras estivessem colocadas a uma distância ideal umas das outras e desde que se verificassem as seguintes condições teóricas: a colisão entre as pedras ser inelástica (uma pedra não dar saltinhos sobre a seguinte ao tombar sobre ela), a fricção entre as pedras e a superfície sobre que assentam ser infinita (as pedras não escorregarem quando tombam) e a fricção entre as pedras ser nula (a pedra que cai deslizar sem atrito sobre a seguinte).

É evidente que as condições ideais não existem na realidade e, por isso, com uma proporção de 2 entre pedras sucessivas, o efeito dominó não se verifica. Se uma pedra for duas vezes mais pesada, duas vezes mais alta, duas vezes mais larga e duas vezes mais espessa do que a anterior, ela de facto não poderá ser derrubada por ela. A proporção terá que ser menor. De qualquer modo, a proporção poderá ser próxima de 2 desde que a superfície sobre que as pedras assentam seja de alto atrito e desde que a aresta superior da pedra que cai seja lubrificada, para poder deslizar facilmente sobre a pedra que derruba. A proporção de 2 é, portanto, um limite teórico.

No vídeo que se segue, Stephen Morris, da Universidade de Toronto, no Canadá, faz uma demonstração de um efeito dominó em que a proporção entre duas pedras sucessivas é de 1,5. As 13 pedras usadas na demonstração caem todas, desde a mais pequenina até à maior.

Ao cair, cada pedra transmite uma dada quantidade de energia cinética à seguinte. Esta energia cinética faz oscilar a pedra seguinte até para lá do seu ponto de equilíbrio. Durante a sua queda, a energia cinética desta outra pedra irá fazer oscilar a pedra que se lhe segue. E assim sucessivamente, num processo em cadeia.

Afinal — perguntar-se-á — de onde é que vem toda esta energia cinética? Ela vem da energia potencial gravítica que tinha ficado armazenada em cada pedra no momento em que a colocámos na vertical. Ao pôr de pé uma pedra, aplicámos-lhe uma dada quantidade de trabalho, isto é, de energia. É esta energia que fica armazenada na pedra sob a forma de energia potencial.

Quando uma pedra tomba, a sua energia potencial é convertida em energia cinética à medida que cai. Quando ela faz tombar a pedra seguinte, comunicando-lhe uma parte desta sua energia cinética a ponto de a fazer oscilar, ela desencadeia a conversão em energia cinética da energia potencial que, por sua vez, estava armazenada na pedra seguinte. A pedra seguinte, que é maior e mais pesada do que a pedra que a faz tombar, não cai só por efeito da energia cinética que lhe foi transmitida; ela cai porque ela mesma tinha armazenada uma energia potencial, que neste caso é mais elevada.

É preciso comunicar mais energia (aplicar mais trabalho) para pôr na vertical uma pedra grande do que uma pedra pequena. A energia assim transmitida, que fica armazenada sob a forma de energia potencial, é portanto mais elevada numa pedra grande do que numa pedra pequena.

Não há qualquer criação de energia no efeito dominó de pedras desiguais. Na Natureza nada se perde, nada se cria, tudo se transforma. Toda a energia que é gasta no efeito dominó já estava armazenada nas pedras sob a forma de energia potencial. Só é preciso aplicar um pouco de energia cinética inicial (um pequeno empurrão) à primeira pedra, para que toda a energia contida em todas as outras pedras se vá libertando sucessivamente.


Comentários: 2

Blogger Um Jeito Manso escreveu...

Ah, a maravilhosa física da matéria. Que texto mais inesperado...! Matemática, física e elegância: há lá mais agradável combinação?

Muito obrigada. Vou ver com atenção. Há coisas que não se agarram à espuma dos dias. Ou melhor, sobrevoam-na. Gostei. Obrigada.

15 maio, 2013 08:58  
Blogger Fernando Ribeiro escreveu...

Quando iniciei este blog, tinha a intenção de também nele publicar, de vez em quando, alguns artigos dedicados à ciência e à tecnologia. Afinal de contas, a minha formação académica é na área das Ciências. Logo descobri, porém, que é muito difícil escrever sobre assuntos científicos e técnicos num curto artigo de blog, sem ser superficial ou sem utilizar uma linguagem hermética.

A Internet em geral e a "blogosfera" em particular não se compadecem com assuntos que sejam tratados com alguma profundidade e/ou extensão. Para isso existem outros meios, como os livros ou as revistas especializadas. Mesmo assim, às vezes resolvo tentar publicar aqui um ou outro artigo de cariz mais técnico ou científico, como aconteceu agora, tentando ser tão claro e tão pouco aborrecido quanto possível.

17 maio, 2013 00:07  

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